sexta-feira, 24 de abril de 2009

Pele

Esbarrou.
E rezou pra que não fosse o fim do mundo.
Estava aprendendo a lidar com aquilo, repetindo incessantemente o pensamento quase independente do cérebro “Pode ser assim. Abdicar, tudo bem”. Queria se convencer de que era normal, que conseguiria se livrar dos pensamentos, dos suspiros, das dúvidas... A alma fica de fora do pacote. O coração disparado não vem ao caso. Nada de drama.
Concentrar em tocar só com as unhas, com vontade e sem carinho. Sem paixão, afeto, bem-querer. Com o querer só, purinho de tudo, o desejo lá do jeito que se pudesse concebê-lo e pronto. Com os hormônios e as unhas, só. No máximo, permitia-se que os cabelos voassem pra um lado ou outro.
As regras não estavam escritas em estatuto ou assinadas em ata, não estavam em lugar nenhum: elas eram simplesmente.
Tinha parado até o pensamento e ignorado o coração ao máximo, pra poder se concentrar no toque. Unhas apenas. Mas aí errou na mão... A medida falhou, um hormônio apareceu no lugar errado, uma célula viva demais quis agir, quis fazer parte do que não podia. Encostava quase calculando os espaços, muito metodicamente.
Acontece que quando se trata da essência, não há método que resolva.

E a essência estava emburrada, nem um pouco convencida pela frase repetida, pelas regras, pela rigidez das unhas. Aí esbarrou.
Sentiu com a pele. Um milionésimo de segundo. Não podia se envolver.
Esbarrou.
E rezou para que não fosse o fim do mundo. Não era. Mas ficou sem.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Ela estava de mudança...

Eu estava ali por outra coisa, porque tinha que estar. E de repente, parei, curiosa.
Os olhos vigiavam um alguém muito distante, irreconhecível daquele ponto. A expressão era dura em contraste com a pele macia, clara demais. Será que ela insistia em procurar o que já estava perdido ou era interpretação errada? E todo aquele mistério, pra quê?
Pensamentos novos passeavam-lhe pela testa em cores variadas e com letras diversas. Alguns eram lembranças, outros, idéias. Havia pares contraditórios mas o conjunto era mais confuso do que divertido. Pelo menos de olhar.
Intrigava.
Ela tinha trocado qualquer coisa no fundo dos traços que me incomodava não identificar. Eu supunha que uma alma inquieta ria-se de mim por detrás dos olhos sérios, escondida. Talvez. Mas, alguma coisa estava diferente. Aqueles cabelos também eram outros? Acho que eram as idéias coloridas, pretas ou brancas que me gritavam com mais insistência: ela está de mudança.
Bastava.

Eu teria jogado uma pedra pra atrapalhar o transe,
em lugar de ir embora emburrada sem reconhecê-la...
Mas quebrar espelhos dá sete anos de azar!